9 de março de 2017

Tratamento Biológico Aerado em Leiras Envelopadas com o Sistema GORE® Cover

Aerated Biological Treatment with Closure Windrows Under GORE® Cover System


RESUMO
A correção orgânica dos solos com dejetos de animais e resíduos vegetais é praticada desde que os solos começaram a ser mobilizados para a produção vegetal, e foi, tradicionalmente, o principal meio de restaurar o balanço de nutrientes no solo (AVNIMELECH, 1986). A compostagem é definida como sendo a decomposição biológica do conteúdo orgânico dos resíduos, sob condições controladas (CARDENAS & WANG, 1980; OBENG, 1982). Dentro da concepção moderna, a compostagem vem sendo definida como um processo aeróbio controlado, desenvolvido por uma colônia mista de micro-organismos, efetuada em duas fases distintas: a primeira, quando ocorrem as reações bioquímicas de oxidação mais intensas predominantemente termofílicas; a segunda, ou fase de maturação, quando ocorre o processo de humificação (PEREIRA NETO, 1996). Atualmente as técnicas de decomposição aeróbia ampliaram suas fronteiras destinando-se não apenas para a geração de composto, mas também sendo aplicadas para fins de secagem biológica e estabilização de rejeitos para garantir uma disposição final com menores impactos ambientais. Este artigo retratará a técnica GORE® Cover, que detém diversas referências em âmbito global, com a implantação de 187 plantas, remontando a uma capacidade operacional instalada de três milhões de toneladas anuais, contribuindo sobremaneira para a proteção do meio ambiente.
Palavras-chave: Tratamento mecânico-biológico. Processo de compostagem. Secagem. Resíduos para energia. Estabilização.

ABSTRACT
The correction of organic soils with manure of animals and vegetable waste is practiced since the soil began to be deployed to the agricultural production, and has been, traditionally, the main means of restoring the balance of nutrients in the soil (AVNIMELECH, 1986). The composting is defined as the biological decomposition of organic content of waste under controlled conditions (CARDENAS & WANG, 1980; OBENG, 1982). Within the modern conception, composting has been defined as a controlled aerobic process, developed by a mixed colony of microorganisms, performed in two distinct phases: the first, when takes place the oxidation biochemical reactions more intense predominantly termofílicas; the second, or stage of maturation, when occurs the process of humus (PEREIRA NETO, 1987). Currently the techniques of aerobic decomposition have expanded their borders and are used not only for the generation of compost, but also being applied for biological drying purposes and stabilization of residues to ensure a final disposal with lower environmental impacts. This article will portray the technical GORE® Cover, which holds several references on a global scale, with the deployment of 187 plants, dating back to an operational capability installed over 3 million tons per year, contributing greatly to the environment protection.
Keywords: Mechanical Biological Treatment. Composting Process. Biodrying. Waste to Energy. Stabilization.

1 INTRODUÇÃO

O relatório Aplicação do Tratamento Mecânico-Biológico de Resíduos no Brasil (2007) define as diferenças entre os processos aeróbios da seguinte forma:
A principal diferença entre os processos de tratamento aeróbio de resíduos consiste nos diferentes sistemas de pré-decomposição e decomposição termófila intensiva. As áreas posteriormente conectadas de pós-decomposição termófila, produção e armazenamento normalmente não são partes específicas do processo. Na fase termófila de pré-decomposição, os materiais orgânicos de fácil degradação são decompostos por micro-organismos com intensidade de degradação relativamente elevada. A duração da fase termófila de pré-decomposição abrange um período de aproximadamente seis semanas. As exigências na administração desta fase, como por exemplo o fornecimento de oxigênio, a regulagem da temperatura e os limites de emissões, são bastante elevadas. Os processos de degradação e de transformação na fase termófila de pós-decomposição são nitidamente mais lentos que na fase termófila intensiva de decomposição. Nesta fase, a velocidade de decomposição pode ser em pequena escala influenciada por medidas técnicas.
As características relevantes de distinção entre os processos aeróbios atuais, são:
• a formação da área de decomposição e a geometria das leiras;
• o tipo de aeração;
• o tipo do sistema de entrada, saída e de revolvimento.

Dentre as técnicas disponíveis no mercado, o sistema GORE® Cover se enquadra em um processo de complexidade mediana e de alta flexibilidade devido a sua pré-disposição modular. Estas vantagens justificam a sua alta aplicabilidade em mercado global, com mais de 187 plantas de tratamento de resíduos, onde são tratadas três milhões de toneladas de resíduos por ano.

Além da aeração, controle, comissionamento e treinamento customizado podemos elencar as seguintes propriedades que diferenciam este sistema:
  • Durabilidade superior a quatro anos garantida em contrato;
  • Funcionalidade no que se refere a permeabilidade do ar e do vapor d’água garantida durante a operação;
  • Baixa ocorrência de odores em decorrência da degradação biológica;
  • Resistência a ácidos e a produtos químicos;
  • Mantêm sua elasticidade também em temperaturas baixas.

2 COMPOSTAGEM EM LEIRAS ENVELOPADAS

O processo de compostagem em leiras, cobertas por lonas especiais e aeradas por aeração forçada, com suprimento controlado de oxigênio, corresponde ao estado da tecnologia mais atual, do ponto de vista tecnológico bem como, ambiental. Este processo se destaca pelo manuseio simples e flexível, rapidez de operação e alta segurança de funcionamento.

Figura 1 – Sistema GORE® Cover
Fonte: Arquivo W.L. Gore & Associates GmbH.

3 COMPONENTES PRINCIPAIS

O sistema é composto por três componentes principais:
  • A aeração forçada fornece oxigênio aos micro-organismos;
  • A aeração é controlada através dos parâmetros oxigênio e temperatura, para a ótima condução do processo de compostagem;
  • O material é coberto com a membrana GORE® Cover e PTFE embutida, para permitir a condução do processo de forma fechada e segura.

3.1 Base

A área destinada à compostagem deve ser impermeabilizada e construída em concreto armado ou em asfalto. Um declive de 2% é suficiente para conduzir as águas de chuva e percolados do processo para sistemas de drenagens concebidos para estas finalidades.

Figura 2 – Reservatório em concreto GORE® Cover
Fonte: Arquivo UTV AG.

3.2 Pré-Tratamento

Os resíduos sólidos trazidos pelos caminhões da coleta são encaminhados para a área de descarregamento. Corpos estranhos de maior volume podem ser removidos manualmente. Em seguida, os resíduos, quando necessário, são misturados com material estruturante, por exemplo resíduos verdes, por meio de uma pá carregadeira ou um sistema de reviramento móvel.

Figura 3 – Resíduos orgânicos selecionados
Fonte: Arquivo UTV AG.

A homogeneização do material resultante é necessária para assegurar a sua aerabilidade. Além disso, a etapa de homogeneização oferece a possibilidade de ajustar o teor de umidade do material. Depois de homogeneizado teremos uma condição ótima em relação ao teor de umidade e ao volume de poros, devendo o material ser depositado no formato de leiras por meio de uma pá carregadora.

3.3 Sistema de Aeração

A aeração é um pré-requisito essencial para a decomposição rápida e sem emissão de odores, do material orgânico. Para esta finalidade, aeradores de média pressão são utilizados, os quais sugam o ar do ambiente e lançam para o interior das leiras, através da tubulação de aeração integrada no piso (“in-floor”).

Figura 4 – Valeta de aeração Gore Cover
Fonte: Arquivo UTV AG.

As calhas de aeração consistem em uma drenagem para a condução do ar e uma chapa resistente a corrosão e acessível por veículos, a qual é provida com um perfil de furos dimensionado de acordo com as necessidades de cada tratamento. Portanto, o ar é conduzido pelos furos para o interior da leira.

4 FLUXO OPERACIONAL

De acordo com Pereira (2014, p. 67):
A compostagem em leiras é tipicamente empregada para quantidades maiores, requerendo largas áreas. Adicionalmente, podem ser identificados problemas de odor e de percolação excessiva durante a decomposição nas leiras. Para remediar estes problemas, em áreas onde as condições pluviométricas são intensas ou mesmo onde a população afetada encontra-se localizada na proximidade da planta de compostagem, devem ser desenvolvidos sistemas simples de cobertura como pátios cobertos ou membranas semipermeáveis, conforme “Aplicação do Tratamento Mecânico-Biológico de Resíduos no Brasil”, de Fricke et al. (2007). (PEREIRA, 2014, p. 67)
Segundo Fricke et al. (2007, p. 42):
Outro método empregado para uma redução sensível dos odores desagradáveis consiste na cobertura das leiras por material tipo membrana semipermeável (FRICKE et al., 1999). Trata-se de um material têxtil, formado por uma camada ativa de microporos e laminada com uma lona plástica altamente resistente visando garantir estabilidade física. A aplicação de membranas permeáveis conduz a uma redução significativa das emissões de odores desagradáveis nas leiras descobertas. (FRICKE et al., 2007, p. 42)
As experiências acumuladas durante a implantação das diversas plantas com tecnologia GORE COVER® atestam a sua funcionalidade no que concerne a redução de odor, eficácia de estabilização e flexibilidade de montagem, podendo ser implementada em etapas segundo demanda do local.

4.1 Compostagem intensiva – Fase I

Durante esta primeira fase de estabilização aeróbia temos uma etapa termofílica intensa onde a leira permanece imóvel por quatro semanas.

4.1.1 Montagem da leira

O material homogeneizado é disposto em leiras por meio de uma pá carregadeira. O material é basculado, começando na parede de contenção, nas calhas de aeração, com os aeradores ligados em operação contínua. Com isso, o entupimento dos furos é evitado e assegurada uma aeração imediata do material.

Figura 5 – Etapa de revolvimento
Fonte: Arquivo UTV AG.

A altura máxima das leiras é de 3 m. As larguras entre 6 m e 8 m e comprimento de, no máximo, 50 m. Estas dimensões deverão ser adequadas durante a fase de planejamento do projeto.

4.1.2 Cobertura das leiras

Figura 6 – Bobina GORE® Cover
Fonte: Arquivo UTV AG.

Depois da montagem das leiras, elas são cobertas com a lona GORE® Cover. Com isso, o sistema fechado atende as normas legais provendo um tratamento controlado da decomposição biológica.

Para tanto, a lona GORE® Cover, enrolada em bobina em um eixo central, instalado na parede de contenção ao lado oposto da área de compostagem, ou em um equipamento de bobinagem móvel, é desenrolada do eixo central e estendida para a leira. O desenrolamento da lona GORE® Cover ocorre por meio de um guincho com cabo, no caso do equipamento instalado no muro; ou no caso do equipamento de bobinagem móvel este é movimentado ao longo da leira, dessa forma a leira é coberta com a lona GORE® Cover, não havendo comprometimento da operação devido ao seu peso. Depois, a cobertura é fixada no chão, com ajuda de mangueiras cheias de ar ou material similar, como saco de areia, as quais são afixadas por meio de laços inseridos nas laterais da cobertura. Depois, a leira é aerada regularmente, sem provocar emissões relevantes de odores ou de patógenos.

Neste sistema, as leiras não precisam ser reviradas durante as primeiras quatro semanas de estabilização biológica, mitigando assim as emissões de odores durante a fase de decomposição intensiva.

4.1.3 Aplicação das sondas

Figura 7 – Sensor de oxigênio GORE® Cover
Fonte: Arquivo UTV AG.

Após a montagem e cobertura das leiras com a lona GORE® Cover, as sondas necessárias para o controle do processo são inseridas. Para tanto, um funcionário sobe na leira e insere a sonda de medição de temperatura verticalmente na abertura demarcada na lona. A sonda é inserida até que os cabos encontrem a superfície da lona.

Figura 8 – Sensor de temperatura GORE® Cover
Fonte: Arquivo UTV AG.

4.1.4 Operação regular

A operação regular é de quatro semanas, onde nesta etapa, o material é aerado segundo os valores limites de oxigênio e temperatura, antes programados em sistema de controle informatizado. O umedecimento e/ou o reviramento das leiras durante este prazo não são necessários.

Do ponto de vista da segurança de trabalho, este sistema fornece condições ideais, pois o material em decomposição intensiva encontra-se isolado e desta forma os funcionários não entram em contato com a massa em decomposição.

4.1.5 Desmontagem das leiras

Após, aproximadamente, quatro semanas, as leiras são desmontadas. Primeiramente, os pesos são removidos das bordas da lona de cobertura, os sensores de medição retirados e guardados com segurança. Logo em seguida, a lona de cobertura é rebobinada no eixo da bobina, por meio de equipamento próprio. O material da leira é desmontado por meio de uma pá carregadeira e transportado para o pós-tratamento.

4.2 Compostagem intensiva – Fase II

A leira é remontada em um novo espaço permanecendo ainda em estabilização por duas semanas e seguindo todas as orientações de montagem de desmontagem previstas no item 4.1.

4.3 Pós-tratamento – Fase III

Depois de duas semanas, a cobertura da leira é removida e os sensores retirados e guardados com segurança. A massa estabilizada é realocada em nova área com piso aerado para uma fase de pós-maturação, caso necessário. Nesta fase, devido ao grau de estabilidade do material, não há emissão significativa de odores e portanto fica dispensada a cobertura da leira. O controle do processo ocorre apenas com a sonda de temperatura.

4.4 Desmontagem, Peneiramento, maturação e beneficiamento

De acordo com cada objetivo de tratamento ou estratégia de comercialização, respectivamente, o material então estabilizado é conduzido para o pós-tratamento ou é peneirado e distribuído como fertilizante.

5 CONCLUSÕES

A busca por alternativas para minimizar os impactos gerados pela gestão tradicional dos resíduos pode ser percebida em âmbito global. Diversos países desde os mais industrializados até os subdesenvolvidos têm já alguma ação implementada, seja em pequena escala e envolvendo poucos recursos seja em larga escala em plantas automatizadas.

Avaliando este cenário podemos concluir que há demanda por tecnologias simples, por exemplo os revolvedores de leiras com maior demanda de área, emissão de odor mas de baixo investimento e baixa complexidade operacional, estes classificados como sistemas extensivos, para tecnologias medianas como a apresentada neste artigo com sistema intensivo de aeração e leiras envelopadas que mitigam o odor e permitem que a estabilização ocorra em um período mais curto a partir de uma decomposição integralmente controlada e remontam a baixa complexidade operacional, até tecnologias de alta complexidade técnica e operacional, como por exemplo os túneis e galpões aerados que apesar de menor demanda de área e maior controle de emissões, resultam em custos elevados de construção civil e equipamentos.

O tomador de decisão deverá avaliar a operacionalidade do sistema, montante de investimento e operação bem como critérios ambientais como odor, vetores, emissões líquidas, entre outros.

Nossa proposta é oferecer uma tecnologia de aeração maleável que se adéqua a qualquer substrato e subproduto, podendo ser implantada rapidamente, indo de encontro às premissas legais e ao senso comum de que o aterro não é tratamento e as frações dispostas in natura se decompõe de forma descontrolada resultando na contaminação dos solos e das águas, emissões de gases de efeito estufa, recalques e fundamentalmente desperdiçando recursos.

Assim, podemos contribuir para melhorar nosso planeta através da utilização de tecnologias biológicas que garantem uma gestão adequada das frações mistas e orgânicas, podendo transformar a biomassa em energia, como a fermentação, ou ainda produzir composto, CDR e rejeitos estabilizados através da decomposição aeróbia.

REFERÊNCIAS

AVNIMELECH, Y. Organic residues in modern agriculture. In: CHEN, Y.; AVNIMELECH, Y. (Eds.). The role of organic matter in modern agriculture. p. 1-9. Netherlands: Martinus Nijhoff, 1986.

CARDENAS, Raul R.; WANG, Lawrence K. Composting process. In: WANG, Lawrence K.; WANG, Mu-Hao S. Handbook of Environmental Egineering. vol. 2, p. 269-327. Nova York: The Human Pres, 1980.

ESAPL – Escola Superior Agrária de Ponte de Lima. Manual de Compostagem. Disponível em: <http://www.ci.esapl.pt/mbrito/compostagem/Manual_Compostagem.htm>. Acesso em: 12 jan. 2015.

FRICKE, Klaus; DICHTL, Norbert; SANTEN, Heike; MÜNNICH, Kai; BAHR, Tobias; HILLEBRECHT, Kai; SCHULZ, Olaf. Aplicação do tratamento mecânico-biológico de resíduos no Brasil. Guia para uma gestão integrada de resíduos sólidos com a aplicação da técnica de TMB compreendendo disposição em aterros, tratamento de chorume e recuperação de aterros desativados. Finanziert durch das Bundesministerium für Bildung und Forschung. Göttingen, Germany: Hubertus & Co, 2007.

PEREIRA NETO, João Tinôco. Manual de Compostagem. Belo Horizonte: UNICEF, 1996.

PEREIRA, Christiane Dias. Rota tecnológica para a gestão sustentável de resíduos sólidos domiciliares. 2014. Trabalho de conclusão de curso (Especialização) – Curso de Pós-Graduação em Direito Ambiental, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2014.




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Como citar [ABNT NBR 6023:2002]:

SCHLIEN, Thomas;  VOGEL, Franz. Tratamento Biológico Aerado em Leiras Envelopadas com o Sistema GORE® Cover. In: FRICKE, Klaus; PEREIRA, Christiane; LEITE, Aguinaldo; BAGNATI, Marius. (Coords.). Gestão sustentável de resíduos sólidos urbanos: transferência de experiência entre a Alemanha e o Brasil. Braunschweig: Technische Universität Braunschweig, 2015. Disponível em: <https://goo.gl/BE246I>. Acesso em: .
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