15 de fevereiro de 2017

Gestão Sustentável de Resíduos Sólidos Urbanos em Cidades de Menor Porte: caso de Votuporanga-SP, Brasil

Sustainable Management Municipal Solid Waste in Smaller Cities: case of Brazil


RESUMO
Votuporanga é uma cidade do interior do Estado de São Paulo, Brasil, que caminha na prática da gestão sustentável dos resíduos sólidos urbanos e desenvolve ações para se ajustar à nova Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei Federal nº 12.305/2010). A coleta regular de lixo, a coleta seletiva e a varrição de logradouros públicos atendem à 100% da população. O município investe na capacitação de seu corpo técnico e administrativo, na modernização das coletas, na implantação de Pontos de Entrega Voluntária (PEV) de vários tipos, tais como o ECOTUDO® e outros dispositivos espalhados pela cidade. Diversos programas atingem a gestão de resíduos especiais (eletroeletrônicos, lâmpadas fluorescentes, óleo de cozinha usado, dentre outros) e, principalmente, a educação ambiental da população e empresas. O projeto ECOTUDO® é uma instalação que trabalha diretamente com a valorização dos resíduos sólidos urbanos através de um manejo organizado e de autocompreensão de seu funcionamento. O Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PMGIRS) de Votuporanga apresenta um diagnóstico completo dos serviços municipais de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, bem como os prognósticos, proposições e metas, tais como: a otimização da coleta seletiva, a modernização da coleta regular, o estabelecimento de parcerias e acordos setoriais para logística reversa, o sistema de remuneração de grandes geradores, a definição da rota tecnológica e a instalação de processo de PPP (Parceria Público-Privada) para o tratamento dos resíduos sólidos urbanos.
Palavras-chave: Resíduos sólidos urbanos. Gestão municipal sustentável. Pontos de Entrega Voluntária. ECOTUDO®. Cidades de menor porte.

ABSTRACT
Votuporanga is a city in São Paulo State, Brazil, who walks toward the sustainable management of municipal solid waste and develops actions to adjust to the new Solid Waste National Policy (Federal Law nº 12305/2010). The city is totally served by regular waste collection, selective collection and public places sweeping. The municipality invests in training the technical and administrative staff, modernization of collections and introduction of waste drop-off places, such as ECOTUDO® Project and other devices around the city. Several programs comprehend the management of special waste (electronics, fluorescent lamps, used cooking oil, among others) and, especially, the environmental education of the population and companies. The ECOTUDO® Project is a facility that works directly with the valorization of urban solid waste through an organized management and self-understanding operation. The Solid Waste Integrated Management Municipal Plan of Votuporanga presents a complete diagnosis of municipal urban cleanning and solid waste management as well as predictions, propositions and goals, such as: optimization of selective collection, modernization of the regular collection, establishment of partnerships and sectoral agreements for reverse logistics, remuneration system of large generators, definition of the technological route and the installation process of PPP (Public Private Partnership) for the municipal solid waste treatment.
Keywords: Urban solid waste. Sustainable municipal management. Waste drop-off places. ECOTUDO®. Smaller cities.


1 INTRODUÇÃO

O Brasil tem o desafio de se ajustar à Lei Federal nº 12.305/2010 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), normativa que moderniza por completo a gestão de resíduos sólidos e se baseia em experiências europeias, principalmente.

Tendo o país dimensões continentais, a aplicação de tal política vai variar bastante visto a heterogeneidade das regiões do Brasil. Ainda dentro da mesma região ou estado, as diferenças entre municípios podem ser grandes, seja nos recursos financeiros e humanos, nas características geográficas, seja nos tipos de resíduos gerados. As maiores cidades brasileiras, leia-se as mais populosas, geralmente congregam maiores condições de desenvolverem ações importantes na gestão de resíduos sólidos, mas nem sempre são as que logram maior êxito.

A presente experiência no município de Votuporanga, interior do Estado de São Paulo, muito tem a contribuir aos modelos a serem empregados no Brasil, pois se trata de uma cidade de pequeno porte que vem obtendo sucesso na maioria de suas ações.

Votuporanga está localizada na região noroeste do Estado de São Paulo, próxima à cidade de São José do Rio Preto (86 km) e distante cerca de 520 km da capital, São Paulo. Possui uma área de 421,034 km2, a uma altitude de 525 metros. Sua população estimada para o ano de 2013 é de 89.715 habitantes, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O relevo é constituído por superfícies planas e o solo se caracteriza como de média e alta fertilidade. O clima é tropical com invernos secos (Aw na classificação de Köppen) com temperatura média anual de 24 °C, tendo a média das máximas de 30 °C e a média das mínimas de 18 °C. A precipitação pluviométrica média anual é de 1.448,7 mm. O mês mais quente é outubro, com média das máximas de 32 °C e o mês mais frio é julho, com média das mínimas de 14 °C. O mês mais chuvoso é janeiro, com precipitação média de 269,6 mm e os meses menos chuvosos são julho e agosto com 22,3 e 22,2 mm, respectivamente, dados do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (CEPAGRI). A localização do município é mostrada na Figura 1.

Figura 1 – Localização do município de Votuporanga – SP



Fonte: Google Earth.

A cidade tem uma relevante indústria moveleira sendo considerada um polo do setor, com cerca de 300 indústrias. Possui outros setores industriais, tais como têxtil, metalúrgica e implementos rodoviários. Segundo dados do IBGE e Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE) para o ano de 2011, O Produto Interno Bruto (PIB) de Votuporanga foi de R$ 1.497.047 e o PIB per capita de R$ 17.535,78. O orçamento municipal total em 2014 foi de R$ 247 milhões.

Votuporanga possui ótimos indicadores relativos ao saneamento, tais como 100% de esgoto coletado e tratado, 100% de água tratada e distribuída e 100% dos imóveis atendidos pela coleta de lixo comum e seletiva (materiais recicláveis). O último Ranking Ambiental Paulista, em 2014, elaborado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente através do Programa Município VerdeAzul, coloca o município em 2º lugar dentre todos os municípios paulistas e na 1ª posição entre os municípios com população entre 50 e 100 mil habitantes.

Os investimentos com a gestão ambiental municipal saltaram de R$ 390 mil em 2005 (Fundação SEADE) para R$ 7,3 milhões em 2013 (dados internos SAEV Ambiental, 2014), um incremento de mais de 1.800% em oito anos.

Com relação aos índices de desenvolvimento humano e social, a cidade de Votuporanga está na 67ª colocação no Brasil segundo o Índice de Desenvolvimento Humano dos Municípios – IDH-M 2010 (PNUD Brasil, 2013), com o valor de 0,790 classificada como cidade de alto desenvolvimento. Outro índice muito utilizado no Brasil é o Índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal (IFDM) que acompanha anualmente, com base em estatísticas públicas oficiais, o desenvolvimento socioeconômico de todos os mais de 5 mil municípios brasileiros em três áreas de atuação: emprego e renda, educação e saúde. Na última edição 2014 (ano-base 2011) o IFDM de Votuporanga foi de 0,9016 colocando a cidade como a 6ª no Brasil.

2 GESTÃO MUNICIPAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS

Os serviços de limpeza urbana prestados pelo município compreendem a coleta convencional dos Resíduos Sólidos Domiciliares (RSD), a coleta seletiva de materiais recicláveis, a varrição de logradouros públicos, a operação de Pontos de Entrega Voluntária (PEVs), capina e roçagem, e limpeza de bueiros.

A coleta e a destinação de resíduos de construção civil (RCC) e dos resíduos de serviço de saúde (RSS) são executadas por empresas privadas com fiscalização do poder público municipal.

No município de Votuporanga a responsabilidade pelos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos é da Superintendência de Água, Esgotos e Meio Ambiente (SAEV Ambiental), Autarquia Municipal, através de seu Departamento de Meio Ambiente, e da Secretaria Municipal de Obras e Serviços Urbanos (Lei Orgânica Municipal nº 47, de 25 de novembro de 2002).

Em 2013, Votuporanga coletou, diariamente, um volume médio de 77,23 toneladas de resíduos sólidos domiciliares e comerciais, conforme a Tabela 1.

Tabela 1 – Geração de RSD em Votuporanga no ano de 2013

Mês 
Volume total
coletado (ton)

Média
diária (ton)
Janeiro
2.587,16
86,24
Fevereiro
2.221,49
79,34
Março
2.209,61
73,65
Abril
2.288,91
76,30
Maio
2.238,96
74,63
Junho
2.151,13
71,70
Julho
2.269,09
75,64
Agosto
2.189,72
72,99
Setembro
2.148,18
71,61
Outubro
2.429,43
80,98
Novembro
2.296,06
76,54
Dezembro
2.613,29
87,11
Médias
2.303,59
77,23

Fonte: Elaborado pelos autores com dados SAEV Ambiental (2013).

A coleta e destinação final dos RSD são terceirizados, bem como a varrição de logradouros públicos. A coleta seletiva é realizada em duas frentes, sendo a coleta porta-a-porta terceirizada e a coleta dos grandes geradores executada pela Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis de Votuporanga (Coopervinte). Esta cooperativa também é responsável pela triagem, beneficiamento e comercialização destes materiais recicláveis coletados.

A coleta seletiva, onde o modelo atual se iniciou em novembro de 2013, vem aumentando gradativamente o volume coletado. O sistema porta-a-porta e PEVs coleta atualmente uma média de 50 toneladas/mês. Adicionando-se o coletado pela Coopervinte, de cerca de 70 toneladas/mês, obtém um montante de 120 toneladas/mês de materiais recicláveis, correspondendo a cerca de 5% dos RSD coletados (Figura 2).

Figura 2 – Gráfico da evolução da Coleta Seletiva
(Sistema Porta-a-Porta e grandes geradores – Coopervinte)
Fonte: Elaborado pelos autores com dados de SAEV Ambiental (2014)
e Coopervinte (2014 [dados não publicados]).

Figura 3 – Gráfico incluindo todas as ações de Coleta Seletiva
praticados no município de Votuporanga
Fonte: Elaborado pelos autores com dados de SAEV Ambiental, Coopervinte
e Secretaria Municipal de Assistência Social (2014 [dados não publicados]).

Quando se inserem os dados do PEV ECOTUDO® (média de 38 toneladas/mês) e dos catadores autônomos (média estimada de 150 toneladas mês), este volume coletado aumenta consideravelmente, atingindo um total de cerca de 300 toneladas/mês, neste caso correspondendo a 13% dos RSD coletados (Figura 3). Ressalta-se que o volume relativo aos catadores autônomos é estimado com relação às famílias que sobrevivem de coleta de recicláveis e pode variar, pois não há controle por parte do poder público.

Em dezembro de 2013 a SAEV Ambiental através de uma parceria com os Rotary Clubs de Votuporanga instalou 15 PEVs (Pontos de Entrega Voluntária) em pontos estratégicos da cidade (Figura 4). Um destes PEVs já existia, totalizando 16 unidades na cidade. Apesar de instalados há pouco tempo, estes dispositivos têm se mostrado uma boa opção à população para descarte de materiais recicláveis.

Figura 4 – PEV metálico localizado em praça pública da cidade
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

2.1 Projeto ECOTUDO®

Até o ano de 2009, o município de Votuporanga possuía diversos “pontos de caçamba” para recebimento de resíduos usualmente não recolhidos pelo serviço de coleta regular. Estes se resumiam em pontos distribuídos estrategicamente na periferia, onde os munícipes depositavam resíduos volumosos e especiais, em caçambas disponibilizadas pela prefeitura. Os materiais ali depositados eram recolhidos e encaminhados para aterro, uma vez que não eram acondicionados adequadamente tornando inviável o reaproveitamento e ou reciclagem. A gestão por parte do poder público destes pontos era muito difícil e a falta de orientação à população tornou alguns destes locais “mini-lixões” (Figura 5).

Após algumas tentativas de adequação chegou-se à conclusão que manter esses pontos era econômica e ambientalmente inviável. Diante do impasse, optou-se pela implantação de PEVs. Os tradicionais PEVs são áreas públicas preparadas para receberem resíduos específicos, em horários e quantidade determinados. Além da restrição de volume e horário, esses PEVs tradicionais geralmente proíbem a disposição de alguns tipos de resíduos como eletroeletrônicos, lâmpadas fluorescentes, óleo de cozinha usado e animais mortos, ficando, às vezes, limitados aos resíduos de construção civil e volumosos. No entanto, foram considerados, durante muito tempo, como a melhor alternativa para resolver o problema dos descartes irregulares, representando importantes ferramentas para os sistemas de gestão. Atualmente, é sabido que a melhor alternativa para a solução dos problemas dos resíduos volumosos está na “entrega seletiva”, onde a segregação é feita pela própria população.

Figura 5 – Antigo ponto de caçamba 
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2009).

Municípios de porte pequeno e médio, com predominância ou grande parte do território em área rural deve basear sua coleta seletiva com a implantação de pontos de entrega voluntária, assim como mencionado por Beltrame (2012) que conclui isto em artigo sobre município pequeno do Rio Grande do Sul.

Assim sendo, a Administração Municipal de Votuporanga, através da SAEV Ambiental, oportunizou a implantação de um PEV diferenciado, orientado para a “entrega seletiva” de modo a possibilitar e incentivar o reaproveitamento e a reciclagem de materiais, que antes tinham como destino o aterro sanitário. Assim, foi criado o ECOTUDO®, com importantes diferenciais como:
  • Recebimento de todo tipo de resíduos, sem exceção, de origem doméstica;
  • Funcionamento ininterrupto, 24 horas por dia, inclusive finais de semana e feriados;
  • Manutenção de funcionários para disciplinar e/ou orientar o descarte;
  • Central de informações sobre disposição de resíduos de origem comercial e industrial;
  • Guarita monitorada 24h;
  • Freezer para congelamento de animais mortos;
  • Baias de separação;
  • Ações voltadas à educação ambiental e, destinação ambientalmente adequada dos resíduos.
Todos os resíduos são cuidadosamente segregados e cada um tem a destinação mais adequada possível. Para tanto, foram firmadas parcerias com empresas transportadoras, recicladoras e cooperativa de catadores de materiais recicláveis.

O município de Votuporanga conta, atualmente, com duas unidades do ECOTUDO® instaladas na zona norte e sul. Em ambos, foram confeccionadas floreiras utilizando pneus inservíveis, e outros materiais recicláveis, num belo projeto paisagístico. São também, dotados de baias e sinalizados para que os usuários possam, ao longo do percurso, depositar seus resíduos separadamente. As Figuras 6 a 19 ilustram a estrutura e os aspectos principais das unidades do ECOTUDO®.

Figura 6 – Entrada e portaria do ECOTUDO® Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 7 – Aspecto geral do barracão do ECOTUDO® Sul

Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 8 – Acesso ao barracão do ECOTUDO® Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 9 – Aspecto geral do interior barracão do ECOTUDO® Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 10 – Aspecto das baias – ECOTUDO® Sul

Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 11 – Baia de tecidos e calçados – ECOTUDO® Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 12 – Local de depósito de materiais recicláveis – ECOTUDO® Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 13 – Parte traseira do local de depósito de materiais recicláveis – ECOTUDO® Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 14 – Caçambas para depósito de resíduos da construção civil – ECOTUDO® Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 15 – Depósito de livros e revistas que se transformou no “Espaço ECOLEITURA”.
Ao lado local de depósito de lâmpadas fluorescentes – ECOTUDO Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 16 – Tanque de óleo de cozinha com carregamento
em caminhão para produção de biodiesel – ECOTUDO® Sul
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 17 – Aspecto do prédio que abriga o ECOTUDO® Norte
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 18 – Interior do barracão do ECOTUDO® Norte, mostrando as baias de resíduos
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

Figura 19 – Interior do barracão do ECOTUDO® Norte com baias e local de recicláveis
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

No ECOTUDO®, não há restrição de materiais, porém, foi projetado para atender, exclusivamente, os geradores de pequenos volumes ficando restrito a resíduos exclusivamente domiciliares. Parte dos objetos (aqueles em bom estado) fica à disposição para que, se houver interesse, sejam doados para pessoas carentes da comunidade. Ambas as unidades são monitoradas além de possuírem guarita e equipe de segurança. Todo e qualquer resíduo tem sua destinação ambientalmente correta garantida, sendo emitidos documentos comprobatórios como Certificado de Movimentação de Resíduos de Interesse Ambiental (CADRI), relatórios, notas e outros certificados.

Figura 20 – Destinação dos principais resíduos recebidos no ECOTUDO®
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

A Figura 20 ilustra a destinação dos diferentes tipos de resíduos domiciliares recebidos no ECOTUDO®. Recentemente, foram firmadas importantes parcerias com a iniciativa privada, através de oferta pública viabilizando a reciclagem de resíduos verdes, para-choques automotivos, eletroeletrônicos e espumas e madeiras de estofados. Essas empresas retiram o material do ECOTUDO®, processam e comercializam os produtos finais. O óleo de cozinha usado passa por filtragem e decantação sendo posteriormente comercializado para fabricação de biodiesel. Os recicláveis são doados à Cooperativa de Catadores e os resíduos inertes, enviados para aterro específico, onde parte é reciclada. Os pneumáticos são enviados para reciclagem através de convênio firmado com a Associação Nacional das Indústrias Pneumáticas (ANIP). Enfim, os resíduos são segregados de modo a favorecer a recuperação dos materiais com alguma possibilidade de reaproveitamento ou reciclagem gerando emprego e renda. Os rejeitos são encaminhados ao aterro sanitário.

Em relação à evolução geral do ECOTUDO®, em abril de 2010 a primeira unidade fechou seu primeiro mês de atendimento com 60 toneladas de resíduos domiciliares diversos. Até dezembro do mesmo ano foram recebidas 1,1 mil toneladas de materiais. Em 2011, já com duas unidades instaladas, chegou-se a um montante de 3,5 mil toneladas. Em 2012, 7,3 mil toneladas e em 2013, um total de 6,5 mil toneladas, totalizando assim, um montante de 18,4 mil toneladas de resíduos desde a implantação do projeto até dezembro de 2013. Tomando como base os dois últimos anos, 2012 e 2013, a média de recebimento é de 575 toneladas/mês, representando 25% do peso dos RSD coletados regularmente. A Figura 21 demonstra a evolução do recebimento de resíduos no ECOTUDO®.

Figura 21 – Evolução da quantidade de resíduos recebidos no ECOTUDO®, em ton/mês
Fonte: Arquivo SAEV Ambiental (2014).

No que diz respeito aos tipos de resíduos recebidos, temos os seguintes dados expressos na Tabela 2:

Tabela 2 – Percentual de cada tipo de resíduo recebido no ECOTUDO®,
de novembro de 2012 a outubro de 2013

Tipo de Resíduo
%
Construção Civil
70,79
Verdes
12,02
Pneus
5,42
Orgânicos
3,56
Doações (roupas, móveis, calçados)
2,25
Recicláveis comuns (papel, plástico, vidro)
2,23
Eletroeletrônicos
1,95
Metais
0,86
Animais mortos
0,52
Madeiras
0,31
Óleo de cozinha usado
0,06
Pilhas e baterias
0,02
Lâmpadas Fluorescentes
0,01
Total
100,00

Fonte: Elaborado pelos autores com dados SAEV Ambiental (2014).

Um dado interessante que não está computado na Tabela 2 é com relação aos sofás recebidos pelo ECOTUDO®. Votuporanga é um dos principais polos de indústrias de móveis do Brasil e, por consequente, a geração deste tipo de resíduo é intensa na cidade. Dito anteriormente que através das parcerias firmadas entre a SAEV e entidades privadas, alguns sofás em melhores condições são coletados e reformados e aquelas unidades em pior estado são parcialmente reaproveitados, com relação às espumas, madeiras e borrachas. Mesmo com tudo isso, ainda se envia ao aterro sanitário, a cada seis meses, uma quantidade aproximada de 50 toneladas de rejeitos de sofás. Estima-se, portanto, que as unidades do ECOTUDO® recebam cerca de 13 toneladas/mês de sofás o que corresponderia a cerca de 300 unidades (peças) por mês.

3 ADEQUAÇÃO À POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS

O principal instrumento preconizado na PNRS é a elaboração do Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PMGIRS). Tal plano, que deverá ser apoiado nos planos Federal e Estadual, visa traçar os objetivos e metas para sistematizar e implementar uma gestão integrada de resíduos sólidos profícua e ajustada ao tipo e problemas do município em questão, além de atender o previsto na legislação em vigor.

Votuporanga procurou elaborar um PMGIRS que realmente atenda as demandas atuais e futuras relacionadas aos resíduos sólidos urbanos e que se encaixe aos problemas enfrentados pelo município, mas com a visão de um futuro progressista e de crescimento social e econômico.

O PMGIRS de Votuporanga apresenta um diagnóstico completo dos serviços municipais de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, bem como devidos prognósticos e proposições. Dentre as principais metas e propostas temos:
  • Otimização da Coleta Seletiva – meta de atingir 30% em 10 anos;
  • Modernização da coleta regular de RSD – proposta de mecanização e conteinerização da coleta;
  • Parcerias e acordos setoriais para logística reversa – o Poder Público Municipal deverá realizar novos acordos setoriais e definir remuneração com o setor produtivo para regrar a coleta e recuperação dos materiais da fração seca constrangidos à logística reversa pela PNRS;
  • Sistema de remuneração para manejo dos RSU – imediata proposição de lei de pagamento de grandes geradores;
  • Definição da rota tecnológica para tratamento de RSU – apontado pelo PMGIRS como a melhor alternativa para Votuporanga (e cidades deste porte), o Tratamento Mecânico e Biológico, através da fermentação seca descontinua e a compostagem, por ser a tecnologia de menor grandeza de impacto e economicamente viável;
  • Instalação de processo de PPP (Parceria Público-Privada) para tratamento de RSU – lançamento ainda em 2014 de uma chamada pública para captar no mercado soluções de valorização de resíduos voltadas para o aproveitamento máximo destas frações e respectivo desvio de massa dos aterros.

4 CONCLUSÕES

A gestão de resíduos sólidos urbanos em cidades de porte pequeno e médio deve se adaptar às realidades de cada localidade e muitas vezes optar por soluções criativas. A heterogeneidade do Brasil se aplica à produção e tipologia dos resíduos sólidos gerados o que se traduz em diversos modelos de gestão que podem ser aplicados.

A falta de recursos financeiros e humanos que aflige muitas cidades menores pode ser compensada por soluções mais ajustadas, pois como vantagem estas cidades podem explorar melhor aspectos como o diagnóstico preciso dos problemas e programas de separação do lixo em escolas, indústria e comércio, além das residências, por conseguir dialogar diretamente com todos estes atores.

A gestão municipal de resíduos sólidos, especialmente pós-PNRS, não consegue avanços sem uma política de valorização de cooperativas de catadores. É papel do poder público municipal estimular a profissionalização das cooperativas e diminuir a dependência destes com as prefeituras.

Toda estrutura montada para auxiliar na gestão de resíduos sólidos deve ser organizada, limpa e de fácil utilização para a população ou para trabalhadores envolvidos. Neste caso, a cidade de Votuporanga torna-se exemplo através do projeto ECOTUDO®, uma instalação que trabalha diretamente com manejo de resíduos sólidos urbanos, mas que preserva o local sem acúmulo de lixo ou detritos, muito organizado e de autocompreensão de seu funcionamento por todos. Isso transmite uma sensação real de valorização dos resíduos sólidos e naturalmente educa as pessoas e empresas.

Votuporanga atingiu a universalização das coletas regular e seletiva. O município investe na capacitação contínua de todos os atores envolvidos na gestão de resíduos, na modernização das coletas, na implantação de PEVs de vários tipos, tais como o ECOTUDO® e dispositivos espalhados pela cidade, na varrição em 100% da área urbana, em programas de resíduos especiais (eletroeletrônicos, lâmpadas fluorescentes, óleo de cozinha usado, dentre outros) e, principalmente, na participação e educação da população como chave no processo.

Tentativas de se fazer a coisa correta existem no Brasil, tais como relatado por Santos (2014) na cidade de Esperança, na Paraíba, município com cerca de 30 mil habitantes, onde existia desde os anos 1990 uma interessante e pioneira iniciativa de triagem do resíduo seco e compostagem do orgânico, organizada em uma planta, mas em 2011 foi desativada e transformada em um lixão a céu aberto.

Galbiati (2005) menciona aspectos de políticas públicas municipais para a gestão de resíduos sólidos em cidades de menor porte do Estado do Mato Grosso do Sul e dentre eles, o oferecimento de apoio técnico às cooperativas de catadores e a junção de ações voltadas para a Educação Ambiental e Social da população, reforçando a vontade política como básica no processo.

Apesar da heterogeneidade das cidades brasileiras, os exemplos de gestão encontrados em Votuporanga podem ser replicados para cidades de portes pequenos e médios, com poucas adaptações.

Conhecimento, criatividade e vontade política são os principais fatores para o sucesso na gestão sustentável de resíduos sólidos urbanos em cidades de menores portes.

REFERÊNCIAS

BELTRAME, T. F. Diagnóstico dos Resíduos Gerados e Viabilidade de Implantação da Coleta Seletiva em um Município do Rio Grande do Sul/RS. In: III CONGRESSO BRASILEIRO DE GESTÃO AMBIENTAL, Goiânia/GO, 2012.

BRASIL. Lei nº 12.305, de 02 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm>. Acesso em: 12 jan. 2015.

CEPAGRI – Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura. Clima dos Municípios Paulistas. Disponível em: <http://www.cpa.unicamp.br/outras-informacoes/clima_muni_644.html>. Acesso em: 28 jul. 2014.

FIRJAN – Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro. Índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal. Disponível em: <http://www.firjan.org.br/ifdm/>. Acesso em: 06 ago. 2014.

GALBIATI, A. F. O Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos e a Reciclagem. Rede Aguapé, 2005.

GOOGLE EARTH. Votuporanga. Disponível em: <https://www.google.com/earth/>. Acesso em: 06 ago. 2014.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Indicadores. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/mapa_site/mapa_site.php#populacao>. Acesso em: 28 jul. 2014.

PNUD BRASIL – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013. Disponível em: <http://www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil/votuporanga_sp>. Acesso em: 06 ago. 2014.

SAEV Ambiental – Superintendência de Água, Esgotos e Meio Ambiente de Votuporanga. Disponível em: <http://www.saev.com.br/>. Acesso em: 06 ago. 2014.

SANTOS, Viviane Paiva dos. Análise do Sistema de Gestão de Resíduos Sólidos no Município de Esperança – PB. 2014. 28f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Geografia)- Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, 2014. 

SÃO PAULO. Secretaria do Meio Ambiente. Município VerdeAzul. Disponível em: <http://www.ambiente.sp.gov.br/municipioverdeazul/ranking-pontuacao/>. Acesso em: 07 ago. 2014.

SEADE – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Informações dos Municípios Paulistas – IMP. Disponível em: <http://produtos.seade.gov.br/produtos/imp/>. Acesso em: 06 ago. 2014.

VOTUPORANGA. Lei Orgânica nº 47, de 25 de novembro de 2002. Dá nova redação à lei orgânica do município. Disponível em: <http://camaravotuporanga.sinoinformatica. com.br/camver/leiorg/leiorg.doc>. Acesso em: 06 ago. 2014.

VOTUPORANGA. Secretaria Municipal de Assistência Social. Disponível em: <http://www.votuporanga.sp.gov.br/n/capa/?x=assistenciasocial>. Acesso em: 06 ago. 2014.



------------------------------------------------
Versão pdf para download, clique aqui.
Uso autorizado desde que citada a fonte e informado via e-mail: gsrsu.br@gmail.com
------------------------------------------------

Como citar [ABNT NBR 6023:2002]:

VILELA, Luiz Gustavo Gallo; RODELLA, Simone Neiva. Gestão Sustentável de Resíduos Sólidos Urbanos em Cidades de Menor Porte: caso de Votuporanga-SP, Brasil. In: FRICKE, Klaus; PEREIRA, Christiane; LEITE, Aguinaldo; BAGNATI, Marius. (Coords.). Gestão sustentável de resíduos sólidos urbanos: transferência de experiência entre a Alemanha e o Brasil. Braunschweig: Technische Universität Braunschweig, 2015. Disponível em: <https://goo.gl/BE246I>. Acesso em: .
------------------------------------------------
[Seja um doador, clique aqui]
[Seja um colaborador, clique aqui]
[Seja um anunciante, clique aqui]
------------------------------------------------